barco negro
(David Mourão-Ferreira) De manhã, que medo, que me achasses feia! Acordei, tremendo, deitada n'areia. Mas logo os teus olhos disseram que não, E o sol penetrou no meu coração. Vi depois, numa rocha, uma cruz, E o teu barco negro dançava na luz Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas Dizem as velhas da praia, que não voltas: São loucas! São loucas! Eu sei, meu amor, Que nem chegaste a partir, Pois tudo, em meu redor, Me diz qu'estás sempre comigo. No vento que lança areia nos vidros; Na água que canta, no fogo mortiço; No calor do leito, nos bancos vazios; Dentro do meu peito, estás sempre comigo. Eu sei, meu amor, Que nem chegaste a partir, Pois tudo, em meu redor, Me diz qu'estás sempre comigo.