madame miau
madame miau desce a rua devagar. apesar da chuva, madame miau não se apressa, antes deixa que ali se misturem as suas lágrimas. ela não sabe porque chora assim. é um miado, um lamento, uma tristeza funda por todas as tristezas do mundo, mesmo as que não conhece. houve tempos, em que madame miau não chorava assim, em que não chovia assim, em que as ruas não ficavam molhadas por tanto tempo, nem inundavam as casas, as coisas, transbordando em tudo. madame miau aperta o casaco sobre o peito e dobra-se mais. o coração ainda bate depressa demais, o seu sexo ainda arde demais, a casa que abandonou ainda está perto demais. teria sido impossível que adivinhasse o amor assim. fora ingénua, demasiado ingénua, talvez... e agora, os seus desenhos navegavam rua abaixo, sangrando em rios de tinta como por dentro ela própria se sentia sangrar. os seus desenhos, atirados borda fora, daquela mesma janela onde tantas e tantas vezes se debruçara a fumar, depois de tantas e tantas vezes amar; desenhos com